Elvis não morreu
- Daniel Frazão
- 9 de jun.
- 4 min de leitura
CONTÉM SPOILERS

O filme de hoje é de 1966. Um velho faroeste-espaguete de Sergio Corbucci. Não confunda
com Sergio Leone, compatriota italiano do Corbucci e maior nome do gênero. Os faroestes do
Corbucci têm suas semelhanças com os faroestes do Leone, mas, essencialmente, são bem
diferentes. Enquanto as narrativas do Leone são épicas e em larga escala, as do Corbucci são
sujas, rasteiras, cruas e gráficas. A cena do cara com a orelha decepada e depois sendo
obrigado a comê-la... Como esquecer?
Estou falando do filme "Django". E não é o "Django Livre" do Tarantino. O Tarantino só pegou
o nome. E o estilo. E a estética. E o clima. E tudo. Aliás, como ele faz em todos os filmes dele.
Todos são tirados de outros lugares. Todos. Tarantino é um grande emulador de gêneros e
narrativas. Ele reproduz o faroeste-espaguete. Reproduz o blaxploitation. Reproduz os filmes
de kung fu dos anos 70. E isso não é uma crítica. Adoro Tarantino e seus filmes. Todos são
incríveis e divertidos. Mas é inegável que sejam emulações. No entanto, reconheço que
Tarantino é genial e emula com maestria.
Emular não é necessariamente um problema, e isso rola em qualquer área da arte. Como
meu lance é escrever, vejo com frequência na literatura. Há, por exemplo, uma porrada de
gente que emula o Stephen King, o Bukowski, o Joyce, a Anne Rice, o García Márquez e etc.
Reproduzem o estilo, a escrita, a imagética, tudo. Alguns com competência e outros, não. O
único porém é que cada pessoa é única, e nenhum desses emuladores viveu a vida dessas
pessoas e viu o mundo com os olhos delas na época, na área e no contexto delas. Então às
vezes acaba ficando meio ridículo.
Bem, acho que estou entrando em digressões. Voltando ao assunto, o filme começa com
um cara carregando um caixão por uma estrada. O caixão está preso a uma corda e o cara o
puxa como um carrinho de brinquedo. É Django, o protagonista do filme. Meio como um Clint
Eastwood, só que, nos filmes do Sergio Leone, o personagem do Clint era taciturno, inabalável,
enquanto que o Django do Franco Nero é mais falante e petulante.
Ao fundo, ouvimos uma música-tema bem melodramática com um cara de voz empostada
tentando imitar Elvis Presley.
Django vê uma mulher ser chicoteada por uma quadrilha de bandidos mexicanos. Ele fica
lá, olhando as chibatadas, até que chega uma quadrilha rival, de homens de capuz vermelho,
que põe os mexicanos pra correr. Depois o Django dá cabo dos encapuzados e salva a mulher.
Com a mulher a tiracolo, Django entra numa cidadezinha decrépita, vazia e enlameada. Vai
puxando aquele caixão tão enlameado quanto a cidade. A gente não sabe o que tem dentro do
caixão, mas imaginamos que seja um cadáver.
Entra numa espécie de saloon/puteiro/albergue e pede pro dono do estabelecimento
hospedar a mulher. Ou melhor, ordena que o cara faça isso. Depois pede comida e bebida.
Senta-se à mesa e fica comendo, na dele, até ser interrompido pela quadrilha dos caras de
capuz vermelho, liderados por um sujeito que não usa capuz, mas usa uma echarpe vermelha
no pescoço. É o Major, o vilão do filme.
E aproveito pra fazer um parêntese sobre os faroestes do Corbucci. Em seus filmes, todo
mundo é meio escroto. O vilão, é claro, mas também os coadjuvantes, a mocinha e até o herói.
É nítido, por exemplo, que o Django não se importa muito com aquela mulher e meio que está
cagando pra ela e pra todo o resto. Basta lembrar de como ele ficou lá, olhando as chibatadas
por longos segundos, e só tomou partido quando o bicho pegou. Todos os personagens são
questionáveis.
Voltando à história, a quadrilha de encapuzados, que parecem membros da KKK, entra no
estabelecimento e tenta botar banca pra cima do Django, e claro que ele saca o revólver e
mata todos eles. Menos o líder, o Major.
Django pergunta quantos homens fazem parte da quadrilha e o Major responde que são 48
homens. Daí Django diz “então volte com os 48 e tente me matar”. E o Major responde “pode
esperar por isso”.
O Major sai de lá jurando vingança.
Ao retornar, está escoltado pelos 48 capangas. Django o espera no meio da rua enlameada,
sentado naquele caixão enlameado. E agora vemos o que há dentro do caixão. Uma
metralhadora grande pra caralho com a qual sai matando todo mundo. Os poucos que restam
dos 48 homens saem correndo com o rabo entre as pernas.
E o filme segue assim.
Depois é a vez dos bandidos mexicanos voltarem à cena. E descobrimos que Django já
conhecia o líder dos mexicanos. Já o salvou algumas vezes. Só que agora ocorre uma treta
entre eles e os mexicanos acabam mortos.
No fim do filme, a quadrilha dos encapuzados faz uma emboscada, dá uma surra no Django e
quebra todos os ossos das duas mãos dele. Ele fica estirado no chão, com as mãos destruídas,
em meio a uma poça de sangue e areia. Preferiram humilhá-lo a matá-lo.
A cena final é um desbunde. Um duelo em um cemitério. Todo arrebentado, com as mãos
em carne viva, Django aguarda o Major e os encapuzados.
Escondido atrás da cruz de uma sepultura, ele apoia o revólver em cima do túmulo, já que as
mãos foram inutilizadas. O par de olhos azuis mira a entrada do cemitério, à espera dos
encapuzados.
Assim que os vilões despontam pelo portão, Django solta chumbo e mata todos eles, inclusive
o Major. Um baita feito para um homem ferido que mal consegue manejar a arma.
Última cena: Django cambaleando para fora do cemitério. Nós o vemos se afastar
enquanto que, em primeiro plano, deixado para trás, jaz em cima do túmulo o revólver sujo de
sangue. A música-tema volta a tocar, entram os créditos e o filme acaba.
Foda.
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