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Elvis continua vivo

  • Foto do escritor: Daniel Frazão
    Daniel Frazão
  • 9 de jun.
  • 4 min de leitura

CONTÉM SPOILERS 2


Continuando com os antigos filmes, agora foi a vez de "Na Calada da Noite" (no original: "Still

of the Night"), de 1982. Esse faz parte de um gênero que gosto muito e que não existe mais

ou, se existe, perdeu toda a magia. É um daqueles thrillers/suspenses neo-noir ao estilo Brian

De Palma, com uma fotografia escura e um clima gostoso de crime pairando no ar. Bem na

linha de "Vestida para Matar" e "Um Tiro na Noite". Aliás, se você vir um filme dos anos 80

com “noite” no título, vai sem medo porque é coisa boa.

Roy Scheider (de "Tubarão") faz um psiquiatra nova-iorquino recém-divorciado. Quando

um dos seus pacientes aparece morto, Roy Scheider recebe a visita da antiga amante do cara,

uma loira linda e muito suspeita interpretada pela Meryl Streep. Hoje em dia, a imagem que as

pessoas têm da Meryl Streep é dessa espécie de “diva do Oscar”, primeira dama do cinema

hollywoodiano, mas, em "Na Calada da Noite", Meryl Streep era uma jovem atriz muito loira e

muito bonita. Muito, muito bonita.

Ela entra no consultório do Roy Scheider (e é impossível olhar pra ele e não se lembrar de

"Tubarão") com aquela pose de femme fatale de um romance do Raymond Chandler. Você

ainda não viu nem dez minutos do filme, mas já sabe que foi ela quem matou o sujeito. Ela

joga aquela conversa-fiada de garota em apuros, principal suspeita da polícia e blablabá,

contando que era secretária do cara morto, em uma casa de leilões, e que sua vida saiu dos

eixos no momento em que teve um caso com ele.

É claro que o Roy Scheider se apaixona por ela e acredita piamente na conversa-fiada dela,

mesmo tudo mostrando o contrário. E é interessante ver o Roy Scheider nessas digressões que

transitam entre a visão de um psiquiatra e a de um cara gamado pela femme fatale. A mãe do

Roy Scheider, que também é psiquiatra (interpretada pela Jessica Tandy, de Conduzindo Miss

Daisy), de vez em quando aparece pra dizer pro filho como ele está entrando numa baita

furada em seu romance com a femme fatale e prova pra ele por A mais B que foi a Meryl

Streep quem matou o cara morto. O papo entre mãe e filho, dois psiquiatras, é interessante

pra burro.

Você passa o filme todo vendo o desenrolar do mistério pelas ruas sujas e urbanas das

noites nova-iorquinas enquanto o psiquiatra mergulha cada vez mais fundo no romance com a

femme fatale e se complica com a polícia.

Roy Scheider é um desses grandes atores que, não importa o quão grande sejam, acabam

inteiramente absorvidos por um determinado papel. No caso dele, o de "Tubarão". É

impossível olhar pro Roy Scheider e não lembrar de "Tubarão". Aquele peixe enorme está

impregnado na figura dele como fumaça de cigarro. Você fica se perguntando se as pessoas

que dividiam cena com ele nos filmes faziam brincadeiras a respeito disso. Por exemplo,

quando a Meryl Streep olha pra ele e sustenta aquele olhar azul e lindo por alguns segundos

até que finalmente diz “I didn’t kill him”. Será que, numa tomada anterior, ela olhou pra ele e

disse “You’re gonna need a bigger boat”? E ambos caíram na risada? Acho que sim. Mesmo

com um lastro de filmes como "Operação França", "All That Jazz" e o próprio "Na Calada da

Noite", é sempre aquele tubarão gigantesco que a gente vê no Roy Scheider.

O filme chega ao fim quando descobrimos que, na verdade, quem matou o cara morto foi

a amante que ele teve antes de se envolver com a Meryl Streep, a colega de trabalho dela na


casa de leilões. Daí rola uma cena de clímax que se passa em uma casa de campo no alto de

um desfiladeiro com um mar revolto lá embaixo. É a casa dos pais da Meryl Streep no filme, e

ela tinha fugido pra lá. A verdadeira assassina vai atrás dela, dá uma facada no Roy Scheider,

mas claro que ele não morre (ainda que não saibamos disso até então).

A verdadeira assassina acua a Meryl Streep na sacada da casa, a poucos centímetros do

desfiladeiro, e rola aquela tensão com a possibilidade de ela cair lá embaixo, embora seja a

Meryl Streep e você saiba que isso não vai acontecer, mas se deixa levar pelo faz-de-conta

mesmo assim.

A verdadeira assassina põe o punhal contra o pescoço da Meryl Streep e diz “pule”. Mas a

Meryl Streep não pula, e ela diz “pule” de novo. Ao ver que isso não vai levar a lugar algum, a

verdadeira assassina avança com punhal em riste contra a Meryl Streep que se esquiva na hora

do golpe. Quem acaba caindo lá embaixo é a verdadeira assassina.

O Roy Scheider se aproxima, a gente vibra ao constatar que ele não morreu com a facada,

ele olha lá para baixo, para o mar, como se ele próprio estivesse pensando naquele tubarão do

outro filme. Eles se abraçam e o filme acaba.

A sensação que fica é a de que o Roy Scheider foi um grande ator e o tubarão seguiu com

ele pelo resto da vida (o que não é necessariamente algo ruim, afinal, "Tubarão" foi outro dos

seus filmes incríveis). E mais uma sensação que fica é a de que a Meryl Streep era realmente

muito loira e muito bonita.

É uma pena que não façam mais filmes assim. Ou então foi a magia que se perdeu.

ree

 
 
 

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